1992



"Portanto, eu ainda não sei o que escrever sobre amor. Porque, acho que sinceramente, nunca vai passar de um paradoxo : um egoísmo altruísta, um mérito que se aceita. Eu teria que continuar pra que ideias fossem expostas, mas a exposição é o cotidiano, e o explícito é a impressão. São perdições, e não tratados e portanto, a dissertação é considerada.

Alguma vez, alguém já foi aceito ?"

Me foi dito, avisado, proclamado: amor, sorte de todos os problemas, razão de todas as soluções.

Ainda confuso sobre o assunto, desbravo-o, como em sala escura pisaria, como em mar revolto mergulharia. Há dois anos (1990) escrevia que as relações me passariam infundadas e suas causas, consequências e processos independiam de fundamentos, sendo o amor, espírito livre indomado, esclarecido em sua obscuridade, pra mim.

Mas, em dois anos se vive, e, em vivência, apresentam-se amor e tantos mais fenômenos, intrínsecos à condição humana, na forma de objetivos, justificativas, pretextos, existências. O amor, em si, se torna ao tornar pessoa em amante; o amante, em si, se torna amor ao ser mesmo, eu, ser; o ser em si, se torna eu, mesmo, ao se ver amor. Confuso, as palavras não bastam: bem claro, que tanto em um sem número de palavras ou na ausência de todas elas, estaria explícito: amor se vive, se prostra. Amor se ama, se ignora. Amor se come, se devora.

Amor se perde.

se acha.



O amor, pessoa, amante, ser, se perde.
O que se perde com o amor?
Ser, pessoa.

Em dois anos, após muito senti-lo, sinto falta,
Sinto que não mais o sinto,
que o vi partir, de vista, e que preciso,
sentir que posso senti-lo outra vez.

Condição à priori de qualquer existência, seja ela fundamentada em alicerce que for, tende a ser, base forte, pedra angular, amor e não mais. O outro, externo ao indivíduo, isolado em seu mundo e indivíduo, viu, em indivíduo alheio, a necessidade: dali, amor parte, e em desejo embarcado, veleja, sobre mares ferozes de medo, sobre tormentas terríveis de orgulho, sobre calmarias de silêncio.
Eu o vi e vivi. Eu a vi.

Lembro daquele natal, onde queria mesmo, era estar em Pernambuco; você usava um vestido tão lindo. Falando em vestido,

lembro daquele dia, quase dormi em uma apresentação da Orquestra Sinfônica Brasileira. Estávamos na Cidade das Artes, Rio de Janeiro. Você estava com um vestido de gala, desbancando a minha singela camisa social, arrebatando meu ainda mais singelo coração.

Lembro das conversas que varavam a madrugada, que faziam a Alemanha, em pleno inverno, parecer tão quente e aconchegante quanto um colo de vó.

Lembro do sofá desconfortável no qual dormimos na casa de um dos meus melhores amigos.

Lembro da saudade.




E me restam as madrugadas. Me restaram inflamações no fígado, uma cartela de cigarro daqueles mentolados, bem de moça mesmo, porque ao fumar me sinto culpado. Me restam as dores no peito. O remorso.

Porque, se for pra lembrar, me ocorrem também as brigas. As traições. A bile. A decepção e a incerteza, porque, vida, em vida de amor, também tem futuro, comporta decisão, e em decisão falhamos. Já viu falência maior do que aquela pela qual interferimos ao não interferir? O vislumbre da vida que teremos a partir de uma decisão? A decisão de tomar decisões é o primeiro vício humano.
O amor nos obriga a escolhas

E nos vemos - e eu me vejo - à mercê da infantil condição de aguardar.

O que vejo agora são os anos passarem.
O que vejo agora é a própria solidão.

Eu não sei o que o milênio novo prepara pra mim. A próxima postagem, daqui a 2 anos, em 1994, me revelará o fruto da espera.

Eu perdi.

Me sinto sozinho.

É isso.

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